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4º domingo da quaresma - ano C - ou Domingo da alegria

09-03-2013 14:30

Parábola do Pai Misericordioso

 

 

A liturgia da Palavra deste 4º domingo da Quaresma apresenta-nos no Evangelho de S. Lucas, a Parábola da misericórdia de Deus (Filho Pródigo).

 A força impulsionadora da misericórdia é o amor compassivo e afectuoso de Deus conforme à aliança que Ele por bondade estabeleceu com o seu povo.

Através de Jesus, a aliança de Deus estendeu-se a toda a humanidade. A sua misericórdia voltou-se para os humanos, radicalmente incapazes de se salvarem.

 Assim, «Cristo (…) revela Deus “rico em misericórdia”. E mostra o Pai como amor e misericórdia, fazendo deste tem um dos principais da sua pregação.

 A “parábola do filho pródigo” ilustra bem essa misericórdia de Deus, exprimindo de maneira simples mas profunda (…) a mais concreta expressão do amor e da presença da misericórdia no mundo humano».

O filho mais novo fez uma aposta errada na roleta da vida e perdeu tudo. E Chegado a um beco sem saída, só tinha uma alternativa ao desespero que sentia: fazer o caminho de retorno. Tomou a decisão correcta, “dando a volta” à sua situação miserável e voltando ao seio do pai. Foram a meditação e a oração que o repuseram no caminho direito: «Caindo em si, disse: “Irei ter com meu pai e dir-lhe-ei: pai, pequei contra o céu e contra ti”.»

    A atitude lúcida de pôr-se a caminho da casa do pai corresponde à essência da boa-nova de Jesus: «Arrependei-vos e acreditai no evangelho». Esta conversão é um deixar de olhar para o passado e um voltar-se para o futuro, iniciando uma vida nova. A autêntica declaração feita diante do pai é uma das mais sentidas formulações bíblicas da confissão dos pecados. Mas – note-se – o que salvou o filho não foi a confissão; foi o amor entranhado do pai, expresso no seu abraço, nos beijos efusivos e no acolhimento afectuoso, ainda antes da confissão do filho.

Às vezes parecemo-nos com o filho mais novo:

         O filho mais novo é o tipo de pessoa que goza a vida e gosta de a sorver às mãos cheias, querendo desfrutar dela depressa, mesmo que para se satisfazer tenha de servir-se de tudo e de todos. É protótipo dos marginais, dos incrédulos, dos proscritos da sociedade, daqueles que não se permitem amar, porque isso lhes parece um luxo.… mas que, quando se emendam, têm grande capacidade de fazer festa, conscientes de que todos os prazeres juntos não têm sentido em comparação com a alegria que sentem na casa do pai. Este filho, não sendo exemplo no desperdício dos bens do pai, é de seguir na « determinação» de não ficar preso à miséria e de se acolher à misericórdia do pai.

  Outras vezes parecemo-nos ao filho mais velho, descrito como fiel cumpridor das ordens do pai. O seu problema era pensar a relação com ele segundo a lógica do contrato, em vez da lógica do amor. Calculista, era incapaz de amar gratuitamente, dando importância a coisas materiais: «nunca me deste um cabrito…» Nessa concepção mesquinha da vida, quando as coisas não correm de feição, não se pode ser senão ressentido. E enquanto houver ressentimento não se pode ser feliz.

          Ele estava bloqueado pelos seus mecanismos de defesa, especialmente pelo cumprimento meticuloso dos deveres, que lhe dava orgulho e sentido de perfeição própria. Esse rigor esterilizou (castrou) nele a capacidade para compreender o amor. O fechar-se sobre si próprio cegou-o e não deixou ver a ternura do pai preferindo criar rancor: Não percebia que ‘amor só com amor se paga’ (e que isso não é propriamente uma paga); nem que a sua maior recompensa era estar permanentemente na casa do pai e em comunhão com ele.

         E nós? Damos porque nos é dado e para que nos seja dado, ou damos como exteriorização de um amor interior? A figura do filho mais velho ilustra este drama de cada pessoa nas suas multiformes relações.

         O essencial da parábola é o festival da misericórdia, promovido pelo pai, generoso de amor. De facto, a história de cada filho termina de forma idêntica, com um apelo efusivo do pai à necessidade de fazer festa, como forma subtil de perdoar sem fazer alarde de tão generoso acto.

         Em relação ao filho pródigo, a misericórdia do pai não humilha. Ele nem sequer menciona a absolvição: acolhe sem condições e sem censurar o desatino do filho. A decisão de fazer festa brota de sentimentos interiores: comoveu-se nas suas entranhas – «entranhadamente comovido», diz o texto. Vê-lo ao longe, correr ao seu encontro, lançar-se-lhe ao pescoço e cobri-lo de beijos é como introduzi-lo outra vez nas próprias entranhas e gerar de novo esse filho desfeito. O pai é como que tocado no seio maternal, que gera a vida; o seu amor é total e implica todas as dimensões: amor paterno, materno e de amigo. Enquanto tal, é criativo e regenerador: por isso, poderá dar de novo a vida ao filho que «estava morto».

         Essa regeneração acontece através da misericórdia. Perdoando, cancela objectivamente a ofensa e dá uma oportunidade completamente nova. O perdão e a alegria do pai anulam o pecador e fazem renascer o filho. Olha para o filho, não para o seu pecado. A sua atitude de amor extremo e extremoso deixa entender que é na misericórdia acolhedora que está o limite para a violência.

         Somos hoje convidados à luz deste ensinamento de Jesus, a deixar-nos ser filhos perante um pai tão generoso.